segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Carta de repúdio ao General Mourão

 Texto escrito em resposta ao texto "Carta pública de apoio ao General Mourão", publicado em jornal de Ponta Grossa em 07/10/2017.
Quem assina esta não é um grupo de patrimonialistas entidades patronais, mas é um simples professor. Mas tenho convicção que esta carta representa o pensamento da grande maioria dos brasileiros,
A fala do General Mourão não usa estas palavras, mas ameaça com o estado de exceção em que se suprimem os direitos, o que entre nós ocorreu entre 1964 e 1985, durante a ditadura militar. E se hoje nossa jovem democracia está criticamente estremecida pela crise entre os poderes e iniquidades neles enraizadas, o estado de exceção em que os direitos são suprimidos é muito pior. A diferença é que na ditadura as iniquidades, os crimes contra o cidadão e o bem público, são ocultas a peso de chumbo e sangue, enquanto hoje temos certa liberdade, transparência e segurança para denunciar e apurar.
E não nos iludamos que as forças armadas signifiquem acerto nos rumos de uma nação. Se não bastassem os exemplos históricos da França de Napoleão, da Alemanha de Hitler, da Rússia de Stálin, do Chile de Pinochet, do Iraque de Saddam, lembremo-nos de que durante a ditadura militar brasileira o país contraiu a maior dívida externa de sua história, só saldada na última década. Para não falar na imensa dívida educacional, da dívida moral, da dívida dos valores civilizatórios que constroem uma sociedade justa e solidária.
Estas dívidas estamos pagando até hoje, por isso nossa jovem democracia ainda sofre esta crise que estamos vivendo. Mas crises são bem-vindas, elas nos mostram que o velho está morto, já não funciona, e o novo ainda não nasceu para substituí-lo.
O velho está morto. O Brasil do coronelismo, das abismais injustiças sociais, dos privilégios das elites e de suas escandalosas artimanhas para continuarem privilegiadas, está morto. A crise dos poderes que vivemos hoje, inclusive o poder da mídia e dos empresários que elegem a maioria dos políticos, não é fruto da falência dos princípios democráticos. Mas é fruto justamente das forças que se opõem aos princípios democráticos, que sabotam e corroem a democracia, que subvertem princípios e suprimem direitos, seja de forma explícita, como nas ditaduras, seja disfarçadamente, como nas sociedades em que os velhos privilégios e injustiças são implacavelmente defendidos.
O novo Brasil há de ser construído não somente sobre o pilar da verdadeira honestidade, mas também sobre o pilar da inclusão e da justiça social, o pilar da liberdade, o pilar da soberania nacional. É hora do Brasil avançar, e não retroceder de sua jovem, imperfeita mas promissora democracia.

Intervenção militar, ditadura, nunca mais!

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Pai nosso...


... assim como nós perdoarmos a quem nos tem ofendido, não nos deixeis cair em tentação e livrai-nos do mal, amém!
Pai, dai-me forças para que eu possa sempre ser arauto do teu amor, testemunho dos ensinamentos evangélicos...
Cacilda, mas que é que estou colocando nas minhas orações! Bestei? Será que não seria melhor pedir, sim, primeiramente perdão dos meus pecados, mas também dinheiro, celebridade e poder, que ninguém vive sem essas benesses essenciais?
Este nosso mundo não merece alcançar a justiça e a solidariedade que os evangelhos nos ensinam! Parece mais que este é mesmo um mundo de penas, de sofrimento. Aprendemos pelo sofrimento na própria carne, e não aquele vivido por outros. O homem torturado e pregado na cruz não consegue nos ensinar lições de amor e sacrifício. Temos nós mesmos que quebrar a cara pra aprender alguma coisa.
Pai, como será que você está se sentindo ao ver-nos em tantos descaminhos e iniquidades neste nosso planeta que já dá sinais de saturação e colapso? Escarnecemos que você anda com o dedo no botão de destruição de sua obra, arrependido do mundo que criou. Será que está mesmo arrependido?
Às vezes penso que entendemos mal. Sua intenção era essa mesmo. Este é um mundo de provas, uma escola austera, e não um mundo destinado à prosperidade, à fruição, à felicidade e à iluminação. Será que a avareza, a ambição, a crueldade, a competitividade, a soberba, a injustiça nunca vão diminuir no planeta Terra? São qualidades que nos colocam à prova, convivendo com elas aprendemos, ou não! Se aprendermos, então iremos para outros planetas, criados para serem melhores. Parece que o nosso, este decantado planeta azul, nunca vai evoluir. É a escola para os alunos renitentes, que têm dificuldade de aprender.
Será que é isso mesmo? Então minhas preces pedindo por um mundo melhor, por gente melhor neste mundo, são vãs? Melhor seria eu rezar para que o mal esteja cada vez mais fortalecido, e assim nos convença com mais veemência de que o bem é preferível? E rezar para que pelo menos eu, e meus próximos mais próximos, aprendamos, para podermos ter direito a mundos melhores?
Pai, se seu filho aparecesse hoje por aqui na Terra, seu destino não seria diferente do que aconteceu já lá se vão dois milênios. Você e seu filho são uma afronta ao mercado, à livre iniciativa, ao empreendedorismo, à competência e ao dinamismo. Hoje seu filho não seria crucificado, mas talvez virasse um indigente perambulando por este mundo de modernidades. Ou seria assassinado, como já foram vários de seus seguidores que ousaram pregar a paz e o amor.
Aliás, acho que aí é que está o fulcro da questão. Você é um deus que não conseguimos compreender. Enquanto a civilização atual é filha do deus mercado, esse sim presente em nossas vidas. Ele nos diz como viver, como ser felizes, que convicções e ideologias são corretas, como votar... Aliás, ele cria e supre nossos desejos, e também supre leis e governantes que primam por atender esses nossos construídos desejos. O deus mercado é muito eficiente. E você, pai, parece-nos muito ausente...
Bem, pai, isto que era pra ser uma oração, virou uma lamentação. Concordo que, olhando bem, o mundo que nos foi concedido, a Terra com todas suas benesses, parece o paraíso. Tão maravilhoso que concedeu-nos o milagre da vida. Mas por que motivo nós humanos fazemos de nossa passagem por aqui um inferno? Exagero meu? Mas guerras, miséria, injustiças, desigualdades, mesquinhez, desonestidade, crueldade e desumanidade são marcas deste nosso mundo, não são?
Só posso acreditar que esse era mesmo seu plano. Este nosso mundo é uma escola. Implacável. Quem passar de ano, vai pra outros mundos melhores. Este, nossa Terra, é pra ser assim mesmo. Um duro campo de provas. Não vai evoluir.

Será?