Publicado no Jornal da Manhã em 01/07/2025.
Os jornais de Ponta Grossa têm noticiado o imbróglio que
envolve o encerramento do Aterro Botuquara, que recebeu o lixo da cidade por
mais de meio século, e foi desativado em 2019. Quando o Botuquara foi instalado,
no final dos anos 1960, as normas ambientais e os atributos naturais da região
eram desconhecidos. Hoje se sabe, o local do aterro não poderia ter sido pior,
do ponto de vista ambiental.
O Botuquara – agora uma montanha de lixo, um incômodo
passivo ambiental – situa-se sobre os arenitos da Formação Furnas, um generoso aquífero,
cada vez mais utilizado por indústrias, postos de serviços, hospitais,
supermercados, granjas e outros empreendimentos de Ponta Grossa e região. O
Aquífero Furnas tem potencial para amenizar as crises hídricas previstas para
os tempos de emergência climática que adentramos. As normas atuais preconizam
que as áreas de recarga dos aquíferos não sejam utilizadas para os aterros,
pelo risco de contaminação dos mananciais subterrâneos. Por esse motivo, recentemente
foi impedida a localização de novo aterro da empresa Ponta Grossa Ambiental, na
região do Rio Verde, ela também situada sobre a área de recarga do aquífero.
Muito se discute a destinação da área do desativado Aterro
Botuquara. Fala-se de plano de recuperação de área degradada, de termo de
ajuste de conduta, em área de lazer, em um sistema de energia solar, em
produção de bioenergia, em Ministério Público, em Secretaria Municipal de Meio
Ambiente, em poluição das águas superficiais e subterrâneas pelo chorume do
antigo aterro. Um imbróglio, aparentemente sem solução, ou com prováveis
soluções para daqui décadas.
O Aterro Botuquara é como um câncer já diagnosticado, mas
para o qual se rejeita tratamento. Ele pode tornar-se incurável e alastrar-se,
se as águas do Aquífero Furnas forem contaminadas. Os aquíferos são fonte
abundante de água de boa qualidade, e têm outras vantagens: dispensam
tratamento e redes de distribuição, não dependem das desastrosas variações das
chuvas, previstas para se acirrarem com as mudanças do clima que estamos
provocando. Mas têm uma vulnerabilidade: não podem ser poluídos. Se o forem,
sua recuperação é inviável. Por todos esses motivos, crescem em todo o mundo os
cuidados para a proteção dos aquíferos.
Além de negligenciar o câncer diagnosticado, o poder
público parece também querer impedir que se façam novos exames, para
compreender o alcance das possíveis metástases: não é feito adequado
monitoramento das lagoas de chorume, não são realizadas nem divulgadas análises
da qualidade da água nos arroios próximos, nem de poços de monitoramento das
águas subterrâneas.
Dadas as características locais, a melhor solução para o
câncer Aterro Botuquara parece ser mesmo extirpá-lo. Transferir a montanha de
lixo para um local sobre solos e rochas naturalmente impermeáveis, sem risco de
contaminação de mananciais subterrâneos nem superficiais.
No município de Ponta Grossa há muitas áreas assim, onde
afloram no terreno rochas argilosas impermeáveis da Formação Ponta Grossa.