Publicado no Jornal da Manhã em 08/07/2025.
Muitos dizem que o capitalismo, que prioriza o lucro e
desdenha a qualidade de vida humana, é o grande vilão do momento de crise que
vive a humanidade. Lucro, qualidade de vida, crise: três conceitos que merecem reflexão.
Consideremos aqui “lucro” não a viabilização econômica de
um empreendimento; este lucro é necessário. O lucro que vemos hoje é a incalculável
concentração de renda por uns poucos, nunca saciados, que se locupletam
explorando o trabalho de uma grande maioria que, à beira da pobreza, luta para
suprir suas necessidades básicas. Este lucro deveria ser mais adequadamente
chamado de esbulho: o roubo do fruto da força do trabalho.
“Qualidade de vida” é o bem-estar social e pessoal, com as
necessidades básicas supridas – alimentação, saúde, moradia, ensino, trabalho, cultura,
lazer, segurança... –, e não o luxo e a ostentação daqueles que precisam
parecer vencedores perante seus próximos. E que têm que viver em moradias que
parecem bunkers, andam em carros blindados, com guarda-costas, acumulam suas
fortunas em contas secretas nos paraísos fiscais. Verdadeira qualidade de vida
implica paz de espírito e paz no mundo, ética, solidariedade, esperança no
porvir, alegria de viver.
“Crise” é a disfunção de algum sistema, seja ele orgânico
ou não. A crise antecede o colapso; ela alerta para o mal funcionamento, antes
que o sistema sofra falência total. Colapso é o caos resultante desta falência.
Um desarranjo muitas vezes com características e alcance imprevisíveis. Atualmente
vivemos muitas crises: ambiental, social, política, sanitária, bélica,
econômica, educacional, de segurança, ética, religiosa... Os sinais são
evidentes. Porém, entre enxergar um sintoma da crise e ser capaz de fazer algo
para evitar o colapso adiante, há uma barreira inexplicável. Por que a
humanidade não é capaz de reverter a crise climática que ameaça exterminar-nos?
Por que não é capaz de distribuir a renda produzida pelo trabalho para acabar
com a fome, a pobreza, a humilhação, a criminalidade, a descrença? Por que não
é capaz de implementar um ensino que privilegie a tolerância, a solidariedade,
o discernimento, o bom senso? Por que não é capaz de findar com as guerras? Por
que não é capaz de usar a bênção das tecnologias para o diálogo honesto, a
compreensão, o bem-estar, e não a desinformação e a manipulação? Por que os
verdadeiros religiosos não conseguem mais transmitir os ensinamentos dos
profetas, e as igrejas transformam-se em heréticos templos de devoção à
prosperidade, ao domínio e ao logro?
Será o capitalismo o responsável por tantas crises, e pelo
colapso vislumbrado à frente? Ou o capitalismo, com todas as crises que ele
engloba, é ele mesmo só mais um resultado de arraigados instintos humanos?
Desde sempre o ser humano tem sido agressivo e dominador. Muito antes do
capitalismo. Mas antes não contávamos com as espetaculares fontes de energia,
nem o conhecimento e as tecnologias que temos hoje. Elas só multiplicam o
alcance da ambição, da agressividade, da dominação e do cego deslumbramento
humanos. O capitalismo é mais um fruto desses infelizes atributos do “Homo sapiens”, que parece mais “demens” que “sapiens”. Fecha-se um ciclo vicioso: os instintos criam o
capitalismo, o capitalismo acirra os instintos.
Vivemos a era em que o deus dinheiro e seu vassalo mercado
conduzem a espécie humana para a autoextinção. Enxergaremos e mudaremos antes
do colapso?
Comparados aos 1,5 milhões de anos que os dinossauros dominaram a terra, os “sapiens” ainda são crianças mal comportadas. Mataram e vão continuar matando por alguns séculos seus semelhantes, em nome de seu deus, seja ele Alah, Buda, Krishna ou dinheiro.
ResponderExcluirO entendimento e respeito real pelo meio ambiente só ocorrerá quando, literalmente, a água passar as nádegas e atingir o pescoço.
Talvez, antes disso, os sapiens já tenham sido substituídos por uma nova raça, assim como aconteceu com os neandertais. Nunca saberemos.
Respondendo ª questão.
ResponderExcluirNão mudaremos nem agora nem nunca.
Se o vassalo fosse só mercado , talvez. Mas a verdade é que todos nós nós curvamos para o dinheiro.
Infelizmente é desse jeito que a história da humanidade vem sendo escrita: manda quem "pode" e obedece quem tem medo da morte.
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