sábado, 19 de julho de 2025

Elevador de Vila Velha, o retrocesso do bom senso

  

Em 2003 o Parque Estadual de Vila Velha – PEVV – passou por um minucioso processo de revitalização: a unidade de conservação foi então reconhecida na sua função de proteção integral da natureza, e muitos dos despautérios que antes lá eram cometidos foram corrigidos. Entre eles, o funcionamento do elevador na Furna 1, a maior do parque. O elevador só não foi retirado porque se alegou incapacidade técnica de fazê-lo sem provocar riscos ambientais ainda maiores do que manter o passivo ambiental. Um monstro a recordar uma época de total incompreensão da razão de ser do parque, a proteção ambiental, um local de singular patrimônio natural: os arenitos, as furnas, a Lagoa Dourada, a vegetação de campos e floresta com araucária, plantas e animais, alguns ameaçados ou endêmicos, como o cacto bola, a suçuarana, o lobo guará, os peixes nas águas do fundo das furnas e na lagoa.

Em 2003 compreendeu-se que, antes de ser uma atração para lazer e turismo, o PEVV é, pela sua excepcionalidade, um local de preservação, onde é possível aprender o funcionamento dos processos naturais na região, e compreender os serviços que a natureza nos presta, facultando o milagre da vida saudável. Vila Velha é para ser protegida, é lugar que deve ser tratado como santuário, laboratório de estudos e de Educação Ambiental, não como fonte de renda.

Em 2003 reconheceu-se o impacto do elevador: óleos lubrificantes derramados nas águas da furna, ruído, vibrações, dejetos. Tudo isso impacta os andorinhões, os peixes, as águas, a estabilidade do maciço rochoso. Reativar o elevador é o clímax do retrocesso desde 2003. O PEVV não é lugar para festivais, feiras, eventos esportivos, espetáculos. Lá é lugar para preservar, estudar, aprender, respeitar, reverenciar. Como vivem os andorinhões, qual seu papel ambiental? Como funciona a diferenciação dos peixes endêmicos isolados nas furnas? Como são as águas do Aquífero Furnas? Como são os arenitos, que em profundidade, longe dos olhos, podem ser reservatórios de água ou hidrocarbonetos? Quais são e como vivem os peixes da Lagoa Dourada e do Rio Guabiroba? Como funcionam os campos nativos e a floresta com araucária? Como os sistemas naturais da região ajudam a equilibrar o ciclo hidrológico, o controle de pragas, a polinização, a retenção de carbono, o clima? Como os processos intempéricos modificam e moldam os arenitos e sua função como aquífero?

Em 2003 compreendeu-se a razão de ser do PEVV: disciplinou-se a visitação, desativou-se o elevador. O erro foi não removê-lo definitivamente quando daquele laivo de bom senso. Desde então, os gestores do parque pouco a pouco vêm substituindo a função ambiental por uma predatória função de atrativo turístico. O PEVV não tem tido uma gestão ambiental; tem tido uma gestão financeira. A reativação do elevador é uma decisão que ignora o que seja uma unidade de conservação de proteção integral, quais suas funções. Falta o PEVV ter um comitê gestor adequado.

Lamentável! Com as singularidades naturais do PEVV poderíamos estar aprendendo com a natureza, que nos concede a vida. Entretanto, transformando-o num produto turístico, estamos violentando quem poderia nos ensinar.

Um comentário:

  1. De retrocesso em retrocesso, vamos envenenando a vida que ainda nos resta. Será que esse é um mal crônico para alegria dos cômicos???

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