sexta-feira, 24 de maio de 2019

A ascensão da direita – refluxo de um ciclo?


Publicado na Revista D'Pontaponta de maio/2019 

A direita não avança só no Brasil, é um fenômeno mundial, que parece querer dizer-nos que a Humanidade vive ciclos de progressos seguidos de retrocessos, como um coração a bater ou um pulmão a respirar. Felizmente os progressos predominam, e na maioria das áreas a sociedade evolui.
Sem dúvida o Brasil é um caso particular: história de colônia saqueada; maior país escravocrata; população indígena exterminada; nação sem laços patrióticos sólidos; território continental com riquezas que despertam cobiça estrangeira; duas décadas de ditadura que calou ou exilou quem ousou sonhar com o país liberto de grilhões neocolonialistas.
Tudo isso marcou-nos profundamente. Nossas elites preferem perpetuar seus privilégios curvando-se, e curvando o país, a interesses transnacionais predatórios e escravocratas. Desdenham tornemo-nos uma nação inclusiva e soberana.
Nossa grande mídia demonizou e sabotou o governo de inspiração popular que procurou tornar o país soberano e diminuir as abissais desigualdades sociais. Pois ela também é controlada pela elite que prefere os interesses corporativos do mercado ao interesse coletivo.
O povo não alcança clareza ideológica e firmeza moral para engajar-se na necessária revolução de valores e condutas para resgatar o país da sanha dos que estão a rapiná-lo. É um povo inculto, propositalmente assim perpetuado por séculos para garantir o papel de colônia explorada, de senzala que não é capaz de emancipar-se.
Povo inculto, com o complexo de vira-lata; elite mercenária, entreguista e apátrida, com o complexo de casa-grande; a mídia facciosa, a serviço dessa elite: eis os ingredientes ideais para que viralizem mentiras e ascenda a direita fantoche dos interesses transnacionais, travestida de salvadora da pátria.
Mas este retrocesso civilizatório pode ser visto como o gérmen de um novo ciclo de esperança e prosperidade que está por começar. A reorganização sucede o caos.

sábado, 4 de maio de 2019

A utilidade do Parque Nacional dos Campos Gerais

Publicado no Jornal da Manhã em 08/05/2019.

Ofício da deputada federal Aline Sleutjes (PSL-PR) ao Ministério do Meio Ambiente solicita a revogação de decreto de 2006 que criou o Parque Nacional dos Campos Gerais. Esta notícia tem alvoroçado a mídia local, leva a crer que o parque seja um estorvo que prejudica a região. A deputada argumenta que o parque foi decretado há muito tempo, demora demais para ser implementado e que os proprietários da área não têm recebido indenização pela imposta redução das atividades.  Alega ainda que a área do parque já se encontra protegida, o que não é verdade.
O problema parece estar sendo abordado às avessas. Ao invés de solicitar a extinção do parque, a deputada e os ruralistas que ela representa deveriam estar empenhados em fazer com que o governo conseguisse as verbas necessárias e enfim implantasse o parque, com a devida indenização dos proprietários. Pedir a extinção do parque, numa comparação sarcástica, seria como se uma família para quem empregadores deixaram de pagar os salários devidos, diante da fome do filho, resolvesse desfazer-se da criança, ao invés de ir à luta para receber o que tem direito. A deputada poderia direcionar seus esforços para que as multas de crimes ambientais (como Brumadinho, Mariana, derrames da Petrobras e tantos outros) fossem de fato pagas, e destinadas para a implantação definitiva das unidades de conservação.
Qual a utilidade, do parque? Por qual motivo toda a população, a começar pelos ruralistas que querem extingui-lo, deveria empenhar-se em defendê-lo? Uma unidade de conservação, bem como as áreas de proteção permanente, têm a função de contribuir para manter as condições ambientais equilibradas, e assim garantir a vida. A proteção ambiental é uma prioridade mundial desde desastres acontecidos a partir da década de 1960, quando os países começaram a implantar políticas e legislação pertinente. Quem ainda não percebeu isso está mais de cinquenta anos atrasado. Ou ainda não superou a ganância cega do lucro rápido, e não a substituiu pela responsabilidade do cuidado com o interesse coletivo, com a vida no planeta.
As unidades de conservação e áreas de proteção permanente não são um capricho para deleite de ambientalistas sonhadores. Elas são prioridade em protocolos internacionais porque se aprendeu que é necessário que existam, entre áreas modificadas pelo ser humano (agrícolas, urbanas, silvicultura, etc.), áreas que propiciem os chamados serviços ambientais essenciais: equilíbrio no ciclo hidrológico, influenciando nos mananciais, no clima, nos solos; equilíbrio na biodiversidade, influenciando no controle de pragas agrícolas, de vetores patológicos (mosquitos da dengue, febre amarela, etc.), de agentes polinizadores (abelhas, besouros, vespas, etc.); preservação do patrimônio genético (aplicação em fitoterápicos, fibras e materiais industriais, etc.); estoque de carbono no solo e na cobertura vegetal (efeito estufa) e outros. Estes serviços influem diretamente inclusive na economia.
Que o Ministério do Meio Ambiente comporte-se como tal, e alie-se à luta pela implantação definitiva do parque nacional, bem como outras demandas ambientais prioritárias. Caso contrário, mais pareceria tratar-se do Cemitério do Meio Ambiente.