sábado, 2 de abril de 2022

A falácia da excelência do saneamento em Ponta Grossa

Publicado no Jornal da Manhã em 10/05/2022.

Ponta Grossa tem sido insistentemente alardeada, pela Sanepar e pela mídia, como uma das cidades melhor saneadas do país. Nos últimos anos os jornais da cidade não se cansam de repetir essa notícia. Mas um breve exame revela o quanto essa afirmação falta com a verdade.

Em 2015 a Câmara Técnica do Comitê de Bacia do Tibagi, da qual faz parte a Sanepar, propôs a reclassificação de vários rios com base nos critérios de qualidade das águas de resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente, o Conama. As reclassificações propostas foram todas no sentido de reconhecer que os rios estavam mais poluídos que na classificação anterior. Entre os rios rebaixados estavam o Pitangui, os arroios Gertrudes e Olarias, todos rios urbanos de Ponta Grossa. Para eles foi então proposta a classe 4 do Conama, aquela que qualifica os rios mais poluídos. Esta proposta de reclassificação de 2015 era um reconhecimento de que a poluição dos rios urbanos de Ponta Grossa estava fora de controle.

Em 2017, durante os trabalhos de implantação do Lago de Olarias, parque urbano de Ponta Grossa, análises da qualidade da água realizadas pela UEPG a pedido da prefeitura, mostraram poluição elevada. Os dados foram considerados sigilosos, e não foram divulgados.

Hoje não é necessário realizar análises: basta visitar as cabeceiras dos arroios urbanos que divergem dos espigões centrais da cidade para constatar que todos estão muito poluídos. São esgotos a céu aberto.

Então, como é possível que a Sanepar alardeie que Ponta Grossa é uma das cidades melhor saneadas do país? As outras estão afogadas em esgoto? A explicação é outra. É possível que Ponta Grossa seja sim uma das cidades com maior cobertura das redes de água potável e esgoto. Mas só isso não garante que o saneamento esteja funcionando. E quem sofre são os rios, que na verdade recebem uma carga de esgotos não contabilizada.

Ponta Grossa é uma cidade muito antiga, principalmente nas edificações ao longo dos espigões centrais. Trata-se de um sítio urbano singular: o centro e as principais radiais situam-se em altos topográficos, deles divergem as cabeceiras dos rios da região, todos da bacia do Tibagi. Antigamente, com a população muito menor, os esgotos eram ligados diretamente à rede pluvial, que se destina a captar a água das chuvas, que vai para os rios. E não à rede própria para os efluentes, que é direcionada para as estações de tratamento de esgotos. Mesmo que a rede de esgoto passe na porta da edificação antiga, a descarga continua sendo feita na rede pluvial. Assim, quem acaba recebendo os esgotos dessas instalações antigas e inadequadas são os arroios urbanos, e não as estações de tratamento. Por esse motivo todos os rios urbanos da cidade continuam poluídos, apesar do crescimento da rede de esgotos.

A remediação do problema é viável, mas demandaria um detalhado e paciente trabalho de verificação, edificação por edificação, do correto despejo dos esgotos produzidos na rede apropriada, e não na rede pluvial que leva aos arroios. Um trabalho demorado, custoso, impopular, que por certo não traria votos nem prestígio. Mas deveria, ao final, alcançar a limpeza dos rios de Ponta Grossa e de toda a bacia do Rio Tibagi, devolvendo à população águas limpas, permitindo aos moradores reintegrá-las ao seu salutar dia a dia e à sua identidade.

 

2 comentários:

  1. Se aí está assim fico imaginando no nordeste , no norte , e mesmo aqui em São Paulo, lavouras regadas a pesticidas proibidos mundo afora.
    Água portanto contaminada e sem rede de esgoto. A lei do mais forte.

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  2. É triste constatar que a mentira, a falta de consideração, de compromisso, prevalecem nesse meio da administração do bem público. Infelizmente é nesse meio que a gangue dos mal intencionados mais se perpétua... Sendo assim, quem é que vai se preocupar em perder seu tempo a fim de dar educação adequada a população que usa e precisa proteger esse bem precioso? ÁGUA. Por isso, deixo aqui o meu respeito às pessoas e ONGS que se dedicam a esse compromisso.

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