Publicado no Diário dos Campos em 3 de setembro de 2016
Estaremos, no Brasil, perdendo a capacidade de distinguir entre os oportunistas e os estadistas?
Estaremos, no Brasil, perdendo a capacidade de distinguir entre os oportunistas e os estadistas?
Oportunistas são aqueles cujo princípio é o da vantagem pessoal ou
de grupos fisiológicos, que não têm ética nem outro ideal, e por isso são
camaleões que mudam de postura ao sabor de conveniências casuísticas.
Estadistas são aqueles que aprenderam a priorizar o interesse coletivo, do
Estado, alcançaram o espírito público, por isso desenvolveram princípios
éticos, que pressupõem o respeito ao direito do outro, a solidariedade, a
inclusão social, a emancipação pessoal e a liberdade e soberania perante todas
as forças retrógradas que tentam perpetuar a opressão da alma humana.
Vivemos no Brasil um momento de crise com mistura de ingredientes
singular: um poder midiático sem precedentes; um desequilíbrio entre executivo,
legislativo e judiciário que revela a fragilidade, a falência, do sistema
político vigente; um embate visceral entre concepções econômico-sociais
neoliberais ou estatizantes; a pressão de um clima mundial de retrocesso, não
só econômico, mas também de valores civilizatórios, da tolerância, da
solidariedade, da paz. O mundo anda intolerante, excludente, beligerante.
Lembremo-nos que crise tem seu lado positivo: ela é a revelação da
decrepitude do velho, quando o novo ainda não surgiu para substituí-lo. O
individualismo, o egoísmo, a exploração, a opressão, a tirania são o velho que
precisa ir-se. A solidariedade, a tolerância, a paz, a responsabilidade, a
honestidade, a esperança, o sonho são o novo que quer, mas está sendo impedido de nascer. Mas cuidemos
para que a crise não se torne colapso, isto é, quando o velho já está morto, e
o novo já não tem mais como nascer.
É bom também, neste nosso país de predomínio da inspiração cristã, que
nos lembremos da tragédia de Cristo. Um homem que pregava a solidariedade, o
amor, o despojamento, a paz, a liberdade. Ele tinha doze seguidores, mas, por
suas pregações, amealhou incontáveis adversários, principalmente entre as
autoridades, locais e do império que então dominava hegemonicamente o mundo. As
convicções de Cristo o levaram à crucificação, não sem antes a ironia de seu
destino ter sido delegado às massas. O poder imperial lavou as mãos, mas o povo
escolheu salvar Barrabás. Sem dúvida identificaram-se mais com o notório
salteador que com o homem que pregava ética.
É possível que possamos comparar Cristo com o estadista, Barrabás
com o oportunista. Suponhamos que hoje nos deparássemos com situação análoga
àquela que teria acontecido há dois mil anos. Qual seria o desfecho?
Uma bela reflexão para esses dias.
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