segunda-feira, 17 de junho de 2019

Igreja sacripanta?

Publicado no Jornal da Manhã em 19/06/2019.

Sexta-feira, 14 de junho de 2019 pela manhã, dia nacional de manifestações contra a reforma da previdência e outras diabruras do governo do presidente que reconhece que não nasceu para o cargo que ocupa. Em Ponta Grossa a manifestação foi marcada para o espaço em frente da Igreja dos Polacos (Igreja Sagrado Coração de Jesus), na Praça Barão de Guaraúna. Um local costumeiro de concentração nas manifestações, dali as passeatas seguem em marcha pela Av. Vicente Machado, artéria nervosa da cidade, até o terminal central de ônibus, junto ao Parque Ambiental.
A frente da igreja é um lugar bem adequado para as concentrações. Ampla escadaria serve de anfiteatro para os manifestantes. Mas não naquela sexta-feira. Ao lá chegarem, as escadarias estavam cercadas com aquelas fitas plásticas amarelas de isolamento, enquanto dois funcionários armados de esfregões e uma mangueira pressurizada realizavam a lavagem dos degraus.
O povo foi chegando e ocupando a praça e as calçadas ao lado da escadaria, a concentração ocorreu normalmente. Os degraus interditados seriam uma facilidade, mas não eram essenciais. Mas ficava evidente que aquela lavagem era um proposital empecilho, cuja eficácia um jovem padre de batina vinha conferir de tempos em tempos. Ao mesmo tempo que verificava a bandeira nacional extemporaneamente hasteada no frontal da igreja. Pobre jovem padre. Se ele se transportasse para a época de Cristo estaria então ao lado dos invasores romanos ou dos fariseus com eles conluiados para a tirania do povo.
Mas a ocorrência mais marcante aconteceu quando a multidão já começava a deslocar-se para a marcha ao longo da Vicente Machado. Aquele aglomerado, eloquente mas pacífico, parece ter sido demasiado para os nervos do funcionário que manejava a mangueira pressurizada. Inesperadamente e sem motivo aparente mirou-a nas costas de moças que se afastavam, alvejando-as com o jato d’água. Possivelmente um arroubo de agressividade inspirado nos delirantes gestos disseminados pelo desatinado presidente e seus asseclas.
O lavador logo se arrependeu de seu acesso, mas ele já fora suficiente para a revolta dos até então pacíficos manifestantes. Ele foi alvo de uma chuva de xingamentos e desqualificações. Ainda bem que se conteve, não voltou a levantar o jato d’água contra o povo indignado. Se o fizesse a paz da manifestação não teria resistido.
O jovem padre que zelava pela interdição da escadaria e o lavador armado com o jato d’água são fiéis símbolos dos desvarios de nossa sociedade. O que pensará o jovem padre do Papa Francisco, que se dedica a tentar fazer a contraditória Igreja Católica voltar-se para o povo simples? O que se passará no íntimo do lavador para, covardemente, descontrolar-se e agredir pelas costas as manifestantes?
Parece bastar uma simples manifestação popular em nome de seus direitos para desencadear reações inesperadas e despertar os demônios que teimam povoar a natureza humana.
É preciso exorcizar esses demônios.

Um comentário:

  1. Nos tempos da ditadura militar tínhamos as vezes mais medo do guardinha da esquina que se não fosse com sua cara, poderia lhe causar problemas do que com os generais que estavam distantes em seus gabinetes com ar condicionado e todas as mordomias. Sei que um só se sente "importante e poderoso" por causa do outro. Estamos vivendo um revival daqueles tempos escuros. Há que se ter muita tranquilidade mas ser firme e forte pra enfrentar essas pequenas provocações. Abs Carlos SA

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