terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Geologia do petróleo e o efeito dominó

 

Corria o ano de 1992. As prioridades de exploração de petróleo no Brasil já eram as bacias da Plataforma Continental, mas o pré-sal ainda era desconhecido. O saudoso Professor Armando Márcio Coimbra, do curso de Geologia da USP, conduzia uma excursão com alunos de graduação e alguns orientandos pós-graduandos ao Recôncavo Baiano. Visitamos muitos afloramentos que mostravam rochas sedimentares e estruturas geológicas, poços de petróleo em perfuração ou em produção, laboratórios, gabinetes e depósitos da Petrobras.

Nos afloramentos aprendíamos sedimentologia, faciologia, estratigrafia, geologia estrutural, tudo voltado às condições de acumulação do petróleo: as rochas produtoras, os reservatórios, as estruturas confinantes. O Armando Muzambinho, com seu inesquecível jeito de mineiro matreiro, já naquele tempo nos dava aulas que nos ensinavam os encadeamentos dos fatores responsáveis pela formação dos indícios que conseguíamos observar, e de como podíamos utilizá-los para interpretações e previsões. Ressaltava que tudo era um efeito dominó, uma circunstância influenciava outra, cada uma com seus respectivos produtos: as rochas, fósseis, estruturas que podíamos ver. Iniciava-nos no holismo da interdisciplinaridade.

Nos poços em perfuração ou em produção, pudemos conhecer, além da Geologia de poço, um pouco de algo que estava além: os equipamentos, a Engenharia, a logística, o pessoal técnico. Um encadeamento de operações e funções que o professor não cansava de lembrar: ─ É tudo um efeito dominó, uma etapa depende da outra. ─ E por lá vimos também o óleo cru, o ouro negro que movimenta a intrincada e insensata civilização atual.

Nos laboratórios e gabinetes da Petrobras mostravam-nos como a tecnologia, já naquele tempo, auxiliava na integração dos dados de superfície e dos poços com a finalidade de interpretar possíveis acumulações de hidrocarbonetos e orientar novas perfurações. Eram sofisticados programas computacionais onde os dados eram compilados em 3D e modelagens indicavam a localização de novos alvos a serem prospectados. Ali também o Muzambinho nos alertava que era tudo um efeito dominó: os dados compilados um a um produziam os resultados esperados.

Mas talvez a melhor demonstração da importância que o Armando tentava nos revelar do tal efeito dominó tenha acontecido mesmo é na última etapa daquela excursão. Fomos visitar um depósito da Petrobras na Cidade Baixa em Salvador, era como se fosse um museu com amostras de afloramento e de subsuperfície de rochas das unidades estratigráficas da Bacia do Recôncavo e de outras bacias continentais e costeiras do Brasil. Num amplo barracão-depósito encontravam-se muitas amostras, em bancadas acompanhando as laterais e numa grande bancada centralizada. Uma longa prateleira a meia altura ocupava três das paredes do barracão. Nela, estavam cuidadosamente colocadas em pé, lado a lado, diagonalmente para quem olhava para a parede, placas retangulares de amostras de rochas obtidas pelo cuidadoso e uniforme corte de testemunhos de sondagem. Uma belíssima coleção, impecavelmente arranjada.

Um dos orientandos do Armando, justamente o mais curioso, não se contentou de observar essas amostras perigosamente dispostas: teve de tocá-las. Não deu outra: uma das placas tombou, desencadeou um inesquecível efeito dominó, que rapidamente propagou-se pelas três prateleiras. Azar maior: a amostra tombada era justamente uma das primeiras de uma das pontas da prateleira. O orientando, quando se deu conta do desastre, chegou a sair correndo atrás das amostras que tombavam disparadas, tentando detê-las. Elas correram mais rápidas. Ele não as alcançou.

Concluída num instante a derrubada das amostras, o prejuízo não foi pouco. Muitas caíram no chão, partiram-se. O silêncio e o estarrecimento dominavam o ambiente, todos se entreolhavam, imóveis miravam o embasbacado orientando, o professor, a paralisada geóloga da Petrobras que estava a nos guiar. Ela, superado o estupor momentâneo, procurou abrandar a situação: ─ Não foi nada não, temos cópia das amostras; um estagiário vai recolocá-las no lugar.

O Muzambinho não perdeu a ocasião: ─ Tudo bem, mas viram agora a importância do efeito dominó?

2 comentários:

  1. Hahaha... mas não era esse o dominó a que o Muzambinho se referia.... só falta dar o nome ao boi...

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  2. Hahaha
    De fato é importante calcular os riscos do efeito domingo.
    Bom final de semana para você

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