O Parque Estadual de Vila Velha foi criado
em 1953, por suas pitorescas e singulares formas rochosas, que já atraíam
visitantes e inspiravam relatos empolgados desde o século XIX. À época da
criação, ainda não eram bem conhecidos nem divulgados os impactos da ação
humana na natureza. Os grandes desastres ambientais ainda não tinham
acontecido, a preocupação com o meio ambiente era desdenhada.
Desde então, muitos erros foram cometidos
no PEVV: restaurantes incrustrados nas rochas, visitação desordenada e
depredação, piscina, kartódromo, refletores coloridos, elevador na Furna 1...
Tudo isso refletiu um tempo de desconhecimento da justificativa ambiental para
a existência das unidades de conservação.
A partir da década de 1980, com o
crescente alerta dos desastres ambientais mundo afora e o alvorecer da
consciência da necessidade das unidades de conservação para preservação de
sítios delimitados relevantes, consolidou-se a legislação ambiental. No Brasil,
ela foi finalmente concretizada no SNUC – Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza –, lei publicada em julho de 2000. A revitalização do
PEVV e remediação de muitos dos erros pretéritos veio então em 2003.
Os seres humanos têm muita dificuldade de
compreender a relevância das UCs e da preservação da natureza. Não temos
responsabilidade nem mesmo com a vida, nem a humana nem a dos demais seres
vivos! Que diria então conseguir alcançar a compreensão da importância do meio
ambiente, que está subjacente ao milagre da vida! E que é responsável pela
preservação e evolução das espécies na Terra, nossa única casa comum! Os
ruralistas, por exemplo, renegam as UCs, não compreendem que elas são a
garantia da preservação do clima, da água, dos polinizadores, do sequestro de
gases estufa, do controle natural de pragas, do equilíbrio da biodiversidade...
Todos estes são fatores que contribuem para a manutenção da fertilidade e produtividade
nos solos agricultáveis. O cidadão comum ainda despreza os alarmes para o
aumento da temperatura, os eventos climáticos extremos, a escassez de água
potável, a subida do nível dos mares, a extinção de espécies, a exaustão dos
solos... Tudo a indicar que estamos a comprometer, para um futuro cada vez mais
próximo, a vida no planeta.
A capela de Vila Velha é, do ponto de
vista ecológico, um erro como todos os outros, cometidos pela incompreensão da
função ambiental das UCs. A diferença é que, se os outros erros eram movidos
por conveniências de alimentação, lazer e comércio, a capela o foi pela fé
cristã. É preciso debater mesmo questões de fé. Nossa civilização é antropocêntrica,
ou melhor, androcêntrica: endeusamos o ponto de vista humano masculino,
subestimamos a natureza e o feminino. Não aprendemos ainda a lidar com a Mãe
Terra, a Pacha Mama dos povos originário sul-americanos.
Com a radical transformação e degradação
do meio natural na região de entorno, o PEVV passou a funcionar como um
santuário vivo da biodiversidade. É muito mais que um templo! O Parque
contribui para a preservação das espécies e mecanismos naturais que tentam
compensar o impacto da ocupação humana. E é um símbolo do esforço para
passarmos de um mundo androcêntrico para outro, que equilibre natureza e
sociedade, o furor masculino e o amor feminino.
A discussão do tombamento da capela e seu
significado como patrimônio cultural não pode ignorar o significado do
patrimônio natural representado pelo PEVV.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirBeleza de texto. Muito bom. Professor precisamos investir fortemente no ensino básico e fundamental.
ResponderExcluirBom dia !
ResponderExcluirComo havia mencionado não conheço o local, mas fica óbvio pelo teor do texto que é de muita importância tanto historicamente, qto sobre a depredação que causaram ao construi-lo.
Pelo que soube irão decidir nós próximos dias se tombam ou não a igreja ou capela.
A minha opinião é pelo tombamento da capela.. Pelas lembranças ali vividas pelos moradores e turistas.
Mas fico feliz por perceber que a preservação ambiental começa , depois de setenta anos , a ser vista como prioridade.
Bem oportuno o teu texto. Esta semana a temperatura da Terra foi a maior dos últimos 1.000 anos. Estamos abrindo a nossa própria cova.
ResponderExcluirObrigada, Mário pela oportunidade de compreender melhor do que se trata a questão sobre a conservação da natureza! Tua pena possibilita a quem insiste em saber, a renúncia do desejo regressivo da onipotência. Parabéns!!!!
ResponderExcluirBela reflexão!!!
ResponderExcluirSempre haverá um ponto de divergência quando entram em jogo duas importâncias, como o meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural. Creio que a convergência deve aparecer em um debate franco, começando por avaliar-se o tamanho do impacto ao meio ambiente que a permanência ou a demolição de uma estrutura, que, embora não devesse estar, ali está. Será uma pena se o debate ficar no raso de outros interesses, usando essas importâncias como escudo.
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