Publicado no Jornal da Manhã em 07/12/2024.
A extrema-direita que prospera no mundo atual, seja qual
for o rótulo que lhe coloquemos – fascismo, neonazismo, totalitarismo, trumpismo,
bolsonarismo –, precisa ser analisada por olhos que vão além da política e da
economia. A extrema-direita é um fenômeno social complexo: cultural, ético,
educacional, ideológico, religioso... Enfim, psicológico.
A extrema-direita é armamentista, negacionista,
segregacionista, narcisista... Muitos outros adjetivos poderiam ser-lhe
atribuídos, mas estes bastam para uma reflexão inicial. O entendimento
psicanalítico do narcisismo dá boa ideia do que seja a extrema-direita: o
narcisista não é só apaixonado pela própria imagem no espelho, mas odeia, e
precisa subjugar – ou destruir – o diferente. A extrema-direita não sabe o
significado da palavra empatia, muito menos das palavras solidariedade e
compaixão.
A crescente organização da extrema-direita no mundo é
financiada por bilionários que já não sabem o que fazer com tanto dinheiro que
amealham. Muitos de seus seguidores pensam que se trata de gênios
empreendedores, meritosos do sucesso financeiro. Outros pensam que toda sua
riqueza provém da falta de ética e de limites com que exploram a humanidade.
Sua principal qualidade, mais do que a engenhosidade e a ambição desmesurada, é
a falta de escrúpulos. São extremados narcisistas.
A extrema-direita talvez seja mesmo o fruto de séculos de
capitalismo, esse sistema econômico que incentiva a competição, a concentração
de riqueza, a disseminação da pobreza, o consumismo insano. Não podia resultar
outra coisa que não fosse a revolta de uma grande parcela da população, aquela
mais desejosa das supostas benesses do capitalismo. Sentindo-se lograda por
nunca alcançar as regalias prometidas, rebela-se; não contra os astuciosos exploradores,
mas contra os explorados como ela.
O equívoco no discernimento de quem seja o responsável pela
crise humanitária que vivemos é fruto de um sofisticado controle da população.
A grande mídia, que domina a veiculação das notícias e influencia a cultura e a
educação, é toda ela uma ferramenta a serviço dos patronos da extrema-direita.
Na verdade, ela é o braço hipnótico que alucina a opinião pública. Esse braço
pertence à extrema direita. Ele manipula, distorce, inventa, mente, distrai,
deturpa, oculta, insufla amor ou ódio. Explora a crendice e a desatenção humana
para instilar os vírus da cizânia, que mantêm a maior parte da população ocupada
com conflitos fratricidas. Enquanto os multimilionários prosseguem impunes, alimentando
sua insaciável ânsia de riqueza e de poder.
A crendice humana talvez nunca tenha sido tão lograda
quanto nestes nossos tempos atuais, dotados da sofisticação da mídia e das
redes sociais. A fé nos messias que ensinaram a ética, a solidariedade, o amor,
a retidão de caráter, deu lugar ao culto ao dinheiro e ao poder, a fé na prosperidade e na dominação. Que
inacreditável incompreensão e distorção!
A causa fundamental do mundo em crise que vivemos – do qual
a extrema-direita é só uma de muitas patologias – talvez não seja o
capitalismo, a religião, a mídia, a educação. Talvez seja o traço narcisista da
natureza humana. Ele é quem tem criado tudo o mais. É preciso com urgência reconhecê-lo
e tratá-lo, cultivando o lado solidário que existe dentro de nós.
Hay que refletir sobre esta analise!
ResponderExcluirA cada texto , me surpreendo com sua sagacidade só analisar o sistema e seus adeptos. Mas mais ainda me surpreende sua crença que haverá mudança no cerne social.
ResponderExcluirConcordo plenamente.
ExcluirParabéns pra você que ainda crê!
ResponderExcluirA eterna luta de se manter humano. Excelente texto!
ResponderExcluirNem freud se voltasse dos mortos daria jeito nesse povo.
ResponderExcluirRilka Bandeira
Difícil continuar crendo na Humanidade. Parabéns pelo texto.
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