Publicado no Jornal da Manhã em 11/03/2025.
O tema da Igreja Católica para a Campanha da Fraternidade
de 2025, iniciada na quarta-feira de cinzas, é “Fraternidade e Ecologia
Integral”. Este tema remete ao conceito de “ecologia profunda”, cunhado pelo
filósofo norueguês Arne Næs em 1972, e que se opõe à “ecologia rasa”. Mais
recentemente, a ecologia profunda tem sido defendida, entre outros, por Fritjof
Capra e, entre nós, Leonardo Boff; autores que têm nos incitado a refletir
sobre os rumos atuais da civilização. Rumos que têm nos conduzido para a aguda
crise não só ambiental, mas também socioeconômica, ética e religiosa que
vivemos hoje.
A crise é profunda. Campanhas de plantio de árvores,
redução de descartáveis, coleta seletiva ajudam, mas são rasas. É como o
fumante inveterado, que fuma dois maços de cigarro por dia, e ao final do dia
toma uma colher de xarope para tentar limpar os pulmões. Colocar em prática a
ecologia profunda implica questionarmos o antropocêntrico sistema de vida que
tem nos sido imposto por um bombardeio incessante de propaganda para que
consumamos sempre mais. Para que continuemos a fazer crescer o lucro das
grandes corporações e de seus donos e acionistas. Como diz Pepe Mujica, antes
os trabalhadores lutavam para reduzir a carga de trabalho de 44 horas semanais;
hoje os trabalhadores precarizados têm dois ou três empregos diferentes, e
vivem o afã de trocar de carro, de comprar o segundo carro, ter uma moto,
trocar o celular, o computador, comprar o eletrodoméstico supérfluo, trocar a
roupa e o calçado que saíram da moda...
Somos hoje a “civilização do consumo”. E também das
desigualdades, do abandono da fraternidade. Há muitos empobrecidos no mundo,
que mal conseguem consumir o suficiente para ter assegurada a alimentação. São
os explorados que sustentam o desarrazoado nível de consumo – e desperdício –
daqueles que estão no alto da pirâmide social.
O afã do consumismo fere profundamente a Mãe Terra que nos
supre. Ela já não dá conta de repor ou recuperar, com os processos naturais,
aquilo que temos consumido e/ou degradado. Isso já acontece até com o ar e a
água, os bens prioritários de que depende a vida. Mas vale também para o solo
agricultável, o alimento saudável, o ambiente harmonioso e pacífico que nos
inspira pertencimento e saúde emocional.
Pensar em ecologia profunda nos obriga repensar os
princípios e valores que uma minoria de megaempresários ensandecidos pelo lucro
e poder impõem a uma grande maioria atordoada pelo bombardeio de uma
sofisticada tecnologia de propaganda e (des)informação. Ela nos incute desejos,
convicções e atitudes antropocêntricas, ou, pior ainda, androcêntricas –
aquelas fundadas no macho. Viver a ecologia profunda é voltar a comungar com a
Mãe Terra, como o fazem os povos originários sobreviventes, que compreendem que
o bem-estar do ser humano depende de enxergar que ele faz parte da natureza, e
não é seu dono, um perverso dominador e explorador.
A civilização atual tem se comportado como o irreverente
adolescente que, deslumbrado com o vislumbre da autonomia e da liberdade, desafia
e mesmo agride e mata a Mãe Terra, quando ela procura mostrar-lhe que a
sobrevivência e a evolução impõem a compreensão de que existem limites a serem
respeitados perante a natureza.
É Mexer na residencia do capitalismo!
ResponderExcluirA esperança é que haja alguma intervenção, nem que tenhamos q engolir "agora" a intromissão da Inteligência Artificial.
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