Publicado no Jornal da Manhã em 17/07/2024.
Primeiro, temos de relembrar o significado de “esquerda”:
na Assembleia Nacional que assumiu o poder após a Revolução Francesa, no final
do século XVIII, tomavam lugar à esquerda do seu presidente aqueles que
ganhavam seu sustento com o próprio trabalho. Eles eram partidários da
revolução e do fim da monarquia. À direita, tomavam lugar ricos negociantes,
empreendedores, empregadores, proprietários de terras e de bens: os burgueses.
Eles eram leais à monarquia. Resumindo, era já o embate trabalho x capital.
E a expressão tão brasileira “pó de arroz”? Ela tem história bem controvertida, mas aceita-se que
resulte da mistura de conflitos raciais, sociais e futebolísticos, no início do
século XX, no futebol carioca: em alguns times mais racistas, os jogadores
negros e pardos usavam o pó de arroz para branquear a pele; tentavam assim ser
menos discriminados pela cartolagem e pelos torcedores racistas. Afinal,
tratava-se do aristocrata esporte bretão, importado das elites da Inglaterra.
O pó de arroz tinha então dois significados: para quem o
usava, era uma tentativa de ser aceito pelos racistas, e assim poder praticar sua
arte; para os racistas que o viam, e sabiam que era uma maquiagem, era uma
maneira de driblar o próprio preconceito. Uma hipocrisia, para perdoar os
próprios instintos racistas. E para franquear a manifestação da paixão
nacional: o futebol. Atualmente, as lutas por igualdade racial afastaram o uso
do pó de arroz. Mas são feridas abertas, o racismo ainda não foi superado.
Aliás, como bem destacou o músico e literato José Miguel
Wisnik em seu livro “Veneno remédio: o
futebol e o Brasil” (Cia. das Letras, 2008), o futebol é o único esporte
que para o planeta! Porque é esporte popular, que pode ser praticado na praia
ou na várzea, e no qual os resultados são muitas vezes imprevisíveis. Não é o
mais rico que ganha sempre, como nos esportes dos poderosos. Amiúde prevalece a raça, a alma, a atitude. Ou pelo menos era assim até pouco tempo
atrás, quando o deus dinheiro ainda não tinha estendido seu manto também sobre o futebol.
Há mais de dois séculos, quando se consolidou a Revolução
Industrial, a luta trabalho x capital vem se acirrando, e produzindo seus
frutos: hiperconsumismo, concentração da riqueza, disseminação da pobreza,
crises sociais, éticas, ideológicas, políticas, ambientais, de segurança...
Bem recentemente, fala-se em direita e esquerda radicais. É
fácil enxergar a direita radical: ela se manifesta no fascismo, na truculência,
no autoritarismo, no negacionismo, na desinformação, que levam ao caos, à
ignorância, à guerra... E o que é a esquerda radical? Aqui muito cuidado: não
confundir esquerda autêntica com esquerda radical. Existem sim aqueles radicais
que condenam o sistema, e até defendam fazê-lo de forma arbitrária e violenta.
Mas tais radicais não podem ser chamados de esquerda, se são conduzidos por impulsos
pessoais e não causas coletivas, de classe. A esquerda autêntica comunga com as
aspirações da classe de trabalhadores, secularmente explorada pela direita dona
do capital.
E a esquerda pó de arroz? É possível a esquerda
disfarçar-se para não sofrer a repulsa e o preconceito da direita? Não!
Convicção política não é o mesmo que futebol. Hoje, até o futebol nos ensina:
os negros afirmam sua negritude numa luta sem cessar pelo reconhecimento de sua
identidade.
A esquerda precisa aprender com o futebol, e firmar-se na
luta de classes com sua identidade e autenticidade. Tem que abandonar o
clientelismo, o corporativismo e o fisiologismo interno, que são marcas da
direita. Ainda que isso signifique reveses momentâneos nas urnas. A firmeza de
ideais e a perseverança hão de mostrar à população que urge a humanidade
encontrar formas mais justas de distribuir a riqueza que o trabalho produz e de
incluir socialmente os trabalhadores. Senão, em breve será o colapso. Não é
possível fazer de conta que não existe a luta de classes. Na verdade, guerra de
classes.
A esquerda autêntica tem que mostrar e defender seus
princípios. Se for uma esquerda “pó de arroz”, só vai implodir-se e prolongar o
injusto sistema que vivemos.
Já está se dissolvendo a olhos vistos .
ResponderExcluiresse embate esquerda x direita se perdeu no tempo. A direita conseguiu criar uma massa de alienados e desinformados que sem nenhuma consciencia politica faz do voto que seria sua arma principal um mero exercicio de pobreza mental, as vezes ate votando nos candidatos mais poderosos ou com melhor aparencia.
ResponderExcluirSe não tivermos uma revolução na educação (e isso leva tempo) o fosso so aumentara.
abs. Carlos SA
A esquerda e a direita são produtos de uma visão de sociedade e de mundo. Sempre vão existir.
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