Publicado no Jornal da Manhã em 16/02/2024.
“Errei,
quero uma chance pra recomeçar/ dizem que pau que nasce torto morre torto/ eu
não sou pau, posso me regenerar” são versos da linda canção “Fraqueza”, sucesso de 1973 de Antônio
Carlos e Jocafi. Nela, os compositores contestam poeticamente o ditado popular
que afirma que o que começa mal nunca vai se consertar: o “pau que nasce torto morre torto”. Ou, traduzindo, que uma pessoa
criada num meio sociocultural com certos conceitos, convicções e atitudes nunca
vá ser capaz de modificá-los, ainda que eles se mostrem daninhos.
O ditado popular tem suas razões de existir:
o ser humano tem notória dificuldade de admitir erros, e, mesmo que os reconheça,
tem imensa dificuldade para mudar! E como erramos! Atualmente, os erros espontâneos,
fruto de acidentes, equívocos ou do desconhecimento, são em número e
importância muito menor que os erros plantados, aqueles para os quais somos induzidos,
pela manipulação e condicionamento.
O ser humano tem muita dificuldade de
reconhecer o quanto ainda é um animal irracional, passível de ser adestrado,
tal como um cão. Assim mostrou Pavlov com os estudos sobre o reflexo
condicionado, este depois comprovado também no Homo sapiens. Mentiras repetidas podem convencer que são verdades. O
erro da mentira passa a guiar o comportamento do indivíduo ludibriado pelo
condicionamento. Ele reage ferozmente, com todo seu instinto animal, se ousam alertá-lo
de seu erro.
Estamos naquela idade da adolescência da
humanidade, em que nossa amoral racionalidade ultrapassou a compreensão, o bom
senso e a ética. As engenhosas tecnologias para a manipulação e o
condicionamento, seja para o consumo, a crença religiosa, as convicções
políticas, a moral e valores, são muito mais poderosas que o discernimento
humano. Não temos mais segurança de sabermos distinguir a mentira da verdade. Nunca
antes as mentiras induziram tantos ao erro. A despeito de tudo o que nossa
inteligência já nos comprovou, ainda são muitos os terraplanistas, os
antivacinas, os céticos do aquecimento global, os que acreditam num deus dinheirista
e segregacionista, ou que o especulativo mercado é capaz de uma justa gestão
econômica, e que, entre as raças e culturas, há as superiores e as inferiores.
E, diante de evidências do equívoco e do
erro, como a humanidade tem reagido? Diálogos francos em busca da compreensão e
do acerto? Ao contrário! Reconhecer o erro seria suposto sinal de fraqueza,
ignorância, inferioridade. Radicalizamos e blindamos a crença no erro. A
convicção no erro passa a fazer parte da essência identitária do indivíduo, e
mesmo de comunidades inteiras. Convicções acirradas, ainda que completamente
equivocadas, enraízam-se, conduzem à segregação, ao ódio, à guerra.
Talvez a humanidade esteja só precisando
ouvir mais canções, como aquelas de cinquenta anos atrás. Como as tais que, embora
com outras palavras, diziam algo como: “Errei,
quero uma chance pra recomeçar/ dizem que pau que nasce torto morre torto/ eu
não sou pau, posso me regenerar”.
Um antigo ditado diz que só nos aprimoramos quando apuramos nossos gostos , sejam musicais ou outros .
ResponderExcluirEstamos regredindo espetacularmente
Alguém que está bitolado em crer numa mentira, se alertado do erro, não gasta nem um minuto para refletir, reage de forma a acabar com o assunto e segue com seus arraigados preceitos. A isso denomino extrema ignorância.
ResponderExcluirAmei o texto! Disse tudo. Quando alguém fala que a Humanidade evoluiu, eu engulo a perguntinha: em quê? Não evoluímos em nada, já perdemos para todas as espécies, digamos, superiores, e ainda vamos perder até para a máquina! Isso sem falar dos micróbios, que são nossos predadores, e não damos conta deles. Podíamos ao menos ganhar de nós mesmos...
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