Ainda bem
menino, frequentemente escutava meu pai dizer: ─ “Religião, futebol e política
não se discutem com amigos”. Ele afirmava que tais discussões descambavam sempre
para brigas, e amizades viravam inimizades. Dizia também que a afirmação já era
dita pelo pai dele, meu avô. Portanto tratava-se de sabedoria popular antiga.
Qual seria o
motivo destes temas, todos eles tão importantes, não poderem ser discutidos?
Talvez pelo fato de que no Brasil são temas que abraçamos com paixão, sem
nenhuma racionalidade? Basta observar as brigas que surgem quando começamos a
discutir a nossa religião, o nosso time de futebol ou a nossa opção partidária
ou ideológica. Brigas que em alguns casos degeneram em desvairada violência,
como nos estádios de futebol, ou, felizmente ainda não no Brasil, em atos de
terrorismo em nome de convicções religiosas e/ou ideológicas. Em outros casos,
as divergências e as discussões políticas geram ressentimentos que vão
alimentando ódios. Estes em nosso país vêm sendo extravasados em segregacionismos
e agressões ainda não calamitosas. Até quando?
Por serem
escolhas passionais, abdicamos de dedicar a estes três temas os mesmos cuidados
de confiabilidade nas informações, reflexão, discernimento e objetividade que dispensamos
a outros aspectos que nos são vitais, no trabalho, na saúde, no lar, nas
finanças... Em se tratando da política, tal desobrigação de correção torna-nos
analfabetos políticos. E não há nada mais nefasto para uma sociedade que os
analfabetos políticos.
Mesmo na
religião e no futebol a irracionalidade nos empobrece. A fé cega nos impede de
ver e vivenciar os edificantes desafios e conquistas do livre arbítrio e da
compreensão da fé diversa da nossa. O torcedor fanático não sabe apreciar o bom
futebol praticado pelo time adversário. Sofre com ele. Mas não existe nada pior
do que a irracionalidade política. Ela nos torna massa de manobra, gado tangido
pelos dissimulados e insinuantes interesses que só desejam nos manter como um
rebanho que serve ao deleite da insaciável cupidez da parcela de seres humanos
que não logra encontrar outro sentido na vida que não seja possuir, explorar e
degradar o próximo e o planeta.
A
irracionalidade política cega mais que a fé cega. Persuasivas técnicas de
manipulação de massas, que atuam via a grande mídia e atualmente também via
redes sociais, deformam o que julgamos ser a nossa opinião, constroem uma
opinião estranha, que serve à realização de objetivos que podem ser o oposto
daquilo que nos beneficiaria.
E assim passamos
a odiar o nosso vizinho, passamos a demonizar aqueles que se dedicam a uma
sociedade mais justa, ao fortalecimento da soberania nacional frente a rapinantes
e dominadores interesses internacionais. E endeusamos quem a mídia nos
apresenta com maquiados ares de civilidade.
A
irracionalidade, seja na religião, no futebol ou na política, resulta da intrínseca
qualidade humana do comodismo. Discernir, deixar de ser irracional, demanda
empenho e envolve incertezas e riscos. Mas se não tivermos a coragem de nos
tornarmos menos irracionais, não deixaremos de ser rebanho tangido. Nossos
sonhos de emancipação humana continuarão sonhos. E o Brasil continuará deitado
em berço esplêndido.
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